sexta-feira, 29 de novembro de 2013

A mudança não tem dono

"A mudança não é uma propriedade privada de alcance exclusivo a uns quantos iluminados em função de um momento particular, contexto ou posição relativa. A ideia de que a mudança é deste ou daquele só porque se mudou de estatuto ou assumiu esta ou aquela posição, pode até ser perversa, além de errada ou, no mínimo, limitada.
A mudança é, antes, um processo, pessoal ou colectivo, pontual ou permanente, ao alcance de qualquer um. Não é uma propriedade concedida por qualquer entidade divina ou providencial nem implica garantias ou credenciais seja de quem o do que seja. A mudança não se apregoa, faz-se, constata-se pelo e no resultado do que se faz, e não no que se diz. Neste contexto, e concedendo que mudança também se pode confundir e coincidir com alterações de lugares, pessoas e processos, mesmo que todos estes nada mudem naquilo que supostamente interessa, também é verdade que a mudança exige conhecimento e memória, sob pena de se tornar palavra vã e conceito vago, rumando ao vazio, a uma mudança brutal em que se passa de algo a nada. Mudança indesejável, inapropriada e até irrecuperável quando o algo tenha sido o resultado de uma verdadeira mudança por muita negação que suscite em particular em memórias de negação.
A Madeira terá mudado a 29 de Setembro último segundo as análises mais exuberantes no calor de um momento tão natural em democracia como deveria ser qualquer eleição. E já tantas aconteceram em democracia como estas que não foram nem mais nem menos democráticas do que outras anteriores. A mudança, em democracia não dura um dia. Faz-se todos os dias e é essa e por essa mudança que os madeirenses anseiam e sempre promoveram. O tempo, quando se olha brevemente para trás, revela mudança, imensa, enorme, grandiosa, maior que a ilha. Só a memória curta ou a falta dela não dá conta disso. Com meios, com dificuldades, com excessos, com defeitos, com desperdício, com limitações, com falhanços, com sucessos, com motivação e inclusão e com falta destas, com momentos mais claros e outros mais difusos mas, sim, com grandes e profundas mudanças, geralmente num sentido de progresso, superação de carências extremas, recuperação de atrasos estruturais e promotora de um maior e melhor acesso e dignidade aos madeirenses em geral.
O caminho não acabou ainda. Aliás, e por definição, não deve ter fim, pelo que se exige continuar, procurar e fazer da mudança um modo de estar e ser. Reduzir a mudança a um momento é negar a sua definição e, não havendo mais que esse pregão, corre-se o risco de ficar por aí, pela ilusão.
Esperemos pois que a mudança, porque é nossa e não de nenhum iluminado, continue e se oriente para todos os madeirenses, e que os inclua, promova e motive, tanto ou mais do que até aqui. Esperemos pois que o sentido da mudança não seja o da orientação para uma visão divina, superior, exclusiva, que se posicione acima de todos os que a deveriam fazer. O pior que poderia acontecer à mudança seria passar a ter um dono."
António Domingos Abreu in Opinião no Diário de Notícias da Madeira

Sem comentários:

Enviar um comentário

O blogue Madeira Minha Vida não é responsável pelos comentários reproduzidos no blogue.
Cada comentário é da responsabilidade de quem o redige.

Comente com ponderação!